Mais doses, mais recursos e adequada coordenação das ações para acelerar a vacinação e proteger o Brasil
Após quase um mês do início da vacinação contra a Covid-19, o Brasil depara-se com grandes desafios políticos e institucionais que ameaçam o adequado enfrentamento da pandemia.
O processo de vacinação no país vem ocorrendo com grande lentidão: até 9 de fevereiro de 2021, menos de 2% da população havia recebido a primeira dose, com média diária de 171 mil doses administradas. Nesse ritmo, serão necessários três anos e meio para vacinar 90% da população.
O Brasil possui grande experiência com campanhas de vacinação, coordenadas pelo Programa Nacional de Imunizações (PNI) ao longo de seus 47 anos de existência e com a produção nacional de imunobiológicos. Com esse acúmulo histórico, é inconcebível a demora na vacinação contra Covid-19, e deve ser considerado que:
- há escassez de vacinas disponíveis no país em razão da limitada produção de vacinas em nível mundial, das dificuldades geradas pelas políticas do governo federal na posição do Brasil no mercado mundial e do atraso da contratação e compra de vacinas e insumos no nível central;
- há omissão do governo federal na condução do PNI, o qual historicamente tem exercido indução verticalizada da política de vacinação para garantir maior coordenação entre as esferas de governo. Os constantes tensionamentos do pacto federativo gerados pelo governo Bolsonaro promoveram a descoordenação das ações e se somaram à ausência de critérios claros por parte do Ministério da Saúde para definir os grupos prioritários na fase inicial de vacinação. Isso facilitou o tensionamento com corporações profissionais que buscam vacinar trabalhadores de suas categorias, mesmo aqueles que não estão na linha de frente;
- o fato de apenas 40% das doses repassadas pelo governo federal aos municípios terem sido aplicadas não demonstra a suficiência de doses das vacinas. Ao contrário, a falta das vacinas e a falta de critérios do nível central têm gerado apreensão e hesitação nos gestores locais quanto à amplitude e ao intervalo da vacinação com as doses disponíveis.
A pressão pela volta às aulas nos ensinos fundamental e médio também têm sido alvo de muita polêmica, especialmente na fase atual de possível imunização. É preciso fazer da pandemia uma oportunidade para fortalecer os laços com as comunidades escolares, valorizar a educação e a escola como espaço de criatividade, compartilhamento e formação cidadã. Este espaço é onde se constrói a visão crítica da sociedade com promoção da cultura da paz e da solidariedade. No entanto, a volta às aulas deve ser organizada e decidida em parceria entre as áreas de educação, saúde e assistência social junto com a sociedade civil, para que soluções sejam construídas coletivamente em cada território, garantindo que todas as medidas de segurança e proteção à comunidade escolar e seus familiares sejam seguidas e fiscalizadas.
Além disso, são também inaceitáveis os ataques desferidos pelo líder do governo na Câmara dos Deputados à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). É inquestionável que a autorização do uso emergencial das vacinas no Brasil deve respeitar a ciência e preservar a qualidade da função reguladora da Agência, essencial para garantir a circulação/comercialização de medicamentos e imunobiológicos seguros e eficazes no país.
A transferência completa da tecnologia das vacinas Coronavac e Oxford/AstraZeneca, com o cumprimento a tempo e a hora do número de doses constantes nos acordos, dará novo impulso à campanha nacional de vacinação. Ao mesmo tempo, deve-se investir na aquisição de outras vacinas para termos o número de doses necessárias para vacinar toda a população o mais rápido possível, assim como garantir o financiamento de pesquisas para desenvolvimento de vacinas brasileiras.
A identificação de novas variantes do vírus no país indica a necessidade de maior articulação entre os laboratórios para que a vigilância epidemiológica possa identificar as cadeias de transmissão e orientar as ações de saúde pública com a devida antecedência, bem como alertar para necessidade de adaptações nas vacinas de forma a manterem sua eficácia.
Por fim, consideramos que o SUS necessita de mais recursos em 2021. A pandemia da Covid-19 continua em expansão, e contraditoriamente, entre janeiro e fevereiro, o número de leitos de UTI financiados pelo governo federal caiu pela metade, sobrecarregando as outras esferas de governo. É fundamental o acréscimo de mais recursos para o orçamento do Ministério da Saúde. Em 2020, sem considerar despesas com vacina, as despesas do Ministério da Saúde ultrapassaram R$ 165 bilhões. Por isso, exigimos a flexibilização do teto de gastos estabelecido pela EC 95, como proposto na petição pública liderada pelo Conselho Nacional de Saúde, para que sejam destinados recursos para o SUS federal que correspondam a um piso de R$ 167,8 bilhões neste ano de 2021.
Conclamamos toda a sociedade brasileira a se somar na luta de que o Brasil precisa do SUS e que as vacinas cheguem a todas e todos.
Frente pela Vida
12 de fevereiro de 2021.
(Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil)